
Todas as semanas, durante cerca de uma hora, os manuais escolares, na Escola Básica de 1º Ciclo da Raposeira, em Elvas, dão lugar ao “Caderno de Modas”, para que a Matemática e a Língua Portuguesa possam, também elas, dar lugar a um dos maiores símbolos de união e autenticidade desta região do país: o Cante Alentejano, reconhecido, há mais de dez anos, como Património Imaterial da Humanidade, pela UNESCO.
Por mais que só agora esteja a ser implementado, o projeto “O Cante Vai à Escola”, de Miguel Rondão, começou a ser pensado e idealizado em 2022. Não existindo, em Elvas, nada do género, o jovem músico, depois de ter reunido três amigos (Jorge Grenho, João Grenho e Carolina Dimas), que têm o mesmo amor por este estilo musical, decidiu, mais tarde, candidatar o “Cante Vai à Escola” ao Orçamento Participativo da Câmara Municipal de Elvas, que viria a ganhar.
Para já, o projeto está implementado em duas escolas – Calçadinha e Raposeira –, mas o objetivo é ir mais longe. “Esperamos ir para Santa Luzia também, brevemente, consoante o nosso tempo e a nossa disponibilidade, mas acima de tudo temos tido um resultado positivo, ao longo destes meses”, assegura Miguel Rondão.







































Quem também espera que este projeto possa chegar a mais crianças é a professora Clara Renga, a coordenadora da EB1 da Raposeira, que não podia estar mais satisfeita pelos seus alunos poderem ter contacto, desta forma, com o Cante Alentejano: “foi uma boa ideia trazer o Cante Alentejano à escola, porque o Miguel, antes de ensinar a canção, explica-lhes a letra e projeta-os, um bocadinho, para o passado”. “O Miguel tem muita calma, é muito sereno, repete as vezes necessárias e acho que fomos abençoados por terem começado por nós”, acrescenta.
“Laranja da China”, “Padeirinha” e “Roubei-te um Beijo” são apenas alguns dos temas que as crianças já sabem de cor e salteado. A verdade é que os mais novos já vão tendo a lição bem estudado. Para Xavier, por exemplo, que confessa gostar de cantar, é “muito importante” manter bem viva a tradição em torno do Cante Alentejo. Nesse sentido, tem procurado incentivar os próprios pais e avós a cantar. O mesmo acontece com Larissa, Irina, Matilde e Santiago.

Com este projeto a dar os seus frutos, diz Miguel Rondão, conhece-se agora quase que um fenómeno: é que, em vez de serem os pais a passarem a tradição aos filhos, começa a acontecer, precisamente, o contrário. “Sofremos aqui uma pequena alteração de paradigma, porque, se na altura, ninguém conhecia, hoje são os mais novos a ensinar aos mais velhos”, garante.
“Tal como quando se candidatou o Cante Alentejano a património, o plano de salvaguarda seriam as nossas crianças e isso está-se a cumprir aqui. É verdade que não sabemos tudo, mas tentamos, com os nossos conhecimentos e com responsabilidade e o máximo respeito pelo cante, transmitir o que sabemos às nossas crianças”, garante o mentor do projeto.
Seja nos grandes palcos, na televisão – tendo em conta as suas participações nos programas The Voice e Got Talent – ou nas escolas de Elvas, Miguel Rondão está a fazer prevalecer a distinção que o Cante Alentejano recebeu a 27 de novembro de 2014, quando foi classificado Património da Humanidade. Cumprindo com o programa de salvaguarda de classificação da UNESCO, este jovem elvense só quer garantir que a tradição do Cante não ficará com o futuro ameaçado.
A reportagem completa para ouvir no podcast abaixo: