
O trabalho sobre “Os Criptojudeus de Monforte”, efetuado por Jorge Martins com o apoio do Município de Monforte, foi publicado em livro com esse título pela Âncora Editora e apresentado em sessão pública realizada no passado sábado, dia 10 de maio, no auditório do Centro de Educação, Formação e Universidade Sénior (CEFUS), em Monforte.
Para além do autor e da responsável pelo Serviço de Turismo e Cultura do Município, Teresa Cunha, autarcas e representantes de vários organismos com intervenção na área do turismo e património, e outros interessados, estiveram presentes o Presidente e o Vice-Presidente do Município, Gonçalo Lagem e Fernando Saião, o representante da editora, António Baptista Lopes, e o Comendador Carolino Tapadejo, castelo-vidense que se distingue pelo trabalho que tem feito para promover a investigação e divulgação do património histórico-cultural judaico de Portugal, em geral, e, em particular, de Castelo de Vide, sua terra natal, e o convidado para apresentar a obra.
Jorge Martins, nascido em Lisboa em 1953, é doutorado em História Contemporânea pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa com uma tese sobre os judeus portugueses (2006) e docente de História desde 1978, é membro do Conselho Consultivo da Rede de Judiarias de Portugal. Tem exercido atividade de formador em centros de formação de professores e é autor de manuais escolares, obras de ficção e ensaio sobre história contemporânea, história local e estudos judaicos e inquisitoriais, temática sobre a qual proferiu diversas conferências e publicou vários estudos, aos quais se junta este sobre “Os Criptojudeus de Monforte”.
Este estudo da presença de cristãos-novos na vila alentejana de Monforte assenta essencialmente na informação que os processos dos presos pelos tribunais da Inquisição de Évora e de Lisboa nos facultaram. Através deles também pudemos conhecer as suas práticas judaicas: as cerimónias, os jejuns, o quotidiano da sua vida comunitária religiosa.
Mas os processos inquisitoriais não nos proporcionaram apenas informação sobre os réus, pois na sessão de genealogia obtivemos dados sobre os parentes: avós, pais, tios, primos, irmãos, cunhados, sobrinhos, cônjuges, filhos, netos. E as profissões, as idades, os locais de nascimento e morada, os nomes dos que tinham sido presos pela Inquisição, a sua origem e os destinos dos seus descendentes. Outra questão importante foi o conhecimento tanto quanto os processos permitiram – da dimensão da comunidade criptojudaica monfortense e a sua persistência durante o período de vigência da Inquisição (1536-1821).
Como é compreensível, quando uma família era quase toda presa, os cristãos-novos iam viver para terras onde não eram conhecidos, para fugir à estigmatização, à discriminação e, por vezes, à hostilização. Em consequência, houve períodos em que se interromperam as prisões de cristãos-novos em Monforte, que, depois de libertados, ou mesmo estando ainda em penitência, foram viver noutras terras, maioritariamente do Alentejo: Arraiolos, Arronches, Avis, Cabeço de Vide, Campo Maior, Elvas, Estremoz, Évora, Fronteira, Lisboa, Ouguela, Portalegre, Sousel, Veiros, Vila Viçosa. E alguns saíram do reino para Espanha e mesmo para a diáspora sefardita: Antuérpia, Flandres, Cabo Verde, India, Brasil, Itália, Porto Rico.
A presença dos judeus em Monforte remonta, pelo menos, ao reinado de D. Afonso II, no início do século XIII, manteve-se até ao final do século XV e sabemos que viviam criptojudeus em Monforte desde a primeira metade do século XVI. As informações recolhidas sobre a genealogia dos primeiros cristãos-novos de Monforte presos pela Inquisição em meados desse século, permitiram-nos concluir que a origem de algumas famílias viria de Espanha, muito provavelmente em consequência do decreto de expulsão de 1492. Contudo, sabendo-se que havia comunidade judaica medieval em Monforte, é também possível que alguns deles fossem seus descendentes diretos. Em todo o caso, podemos afirmar que o criptojudaismo persistiu em Monforte desde a criação da Inquisição (1536) e o seu declínio, em meados do século XVIII.